O que Deus é para você? O texto de hoje é um pouco denso, pode ser de fácil compreensão, mas quem deseja procurar problemas com isso, também creio que não terá dificuldades, mas creio que essa discussão não deixa de ser relevante porque visa desconstruir certos conceitos formados, inclusive um que me incomoda bastante que é o que levas as pessoas a responderem com termos clichê a certas perguntas como esta que fiz inicialmente, então se você respondeu “tudo” a esta pergunta que fiz, esse texto é uma oportunidade para repensar sua resposta, se você quiser.
Muitas pessoas podem responder à pergunta que fizemos no início do nosso texto dizendo que para elas; “Deus é tudo”. Há inclusive músicas e hinos que propagam esta ideia, inclusive há um hino do qual gosto muito que se chama “Cristo é Tudo Para Mim” (“Jesus is All the World to Me” de Will Lamartine Thompson. É o hino 95 do Hinário Adventista). Mas esta resposta ou este termo (Deus é tudo) é incoerente, tanto com a natureza de Deus quanto com o que esta pessoa acredita (porque geralmente quem fala isso, tem uma boa visão a respeito de Deus).
Deus não pode ser tudo, porque no conjunto das coisas existentes e inexistentes, há coisas boas e coisas ruins, há coisas belas e coisas feias, há coisas valiosas e coisas não valiosas. E eu não acredito que Deus seja algo ou alguém feio, ruim e inexistente. Se eu acredito que Deus é o Ser de amor, perdão e misericórdia que ao menos eu mesmo prego, então Deus não pode ser tudo, porque para Ele ser tudo, necessariamente Ele tem que ser as coisas ruins que fazem parte do conjunto de coisas existentes e inexistentes. Se olharmos à luz da lógica clássica, temos por exemplo, Aristóteles dizendo: “nenhum ente pode ser um ser”. Por esta lógica, também encontramos um outro problema na frase “Deus é tudo”, porque se Ele é tudo, então Ele é nada.
Mas antes de pensar que eu esteja blasfemando, pense no seguinte: o ente é diferente do ser. Caso você não saiba a diferença entre ente e ser, vou usar sua situação como exemplo, e suponhamos que você esteja com um celular aí. O seu celular não é o celular, é um celular, portanto, o celular é o ente, um celular é o ser. Há vários celulares pelo mundo, mas todos eles são seres, o ente é o que os caracteriza como celulares. Todos nós olhamos para um IPhone 7 e sabemos que é um celular, mas dizemos também que um Nokia 2300 é um celular mesmo sendo ambos bem diferentes um do outro. Portanto, se Deus for tudo, logo, Deus é uma lixeira, um celular, uma árvore, uma pedra… e se Ele é tudo, então Ele não tem uma identidade, logo Ele é nada. Pode parecer besteira se pensar assim, mas esse tipo de pensamento leva a teologias complexas, por exemplo: se Deus é tudo, então Ele é criador e criatura, logo, eu posso ser Deus; ou ainda: se Deus é tudo, então Ele é esse objetos que citei ou pode ser a natureza, ou uma simples força ativa (quem sabe passiva que leva o acaso a gerar coisas por aí). Somente com essas duas ideias, resumi o pensamento de diversas teologias e religiões existentes.
Por isso, quando somos levados a uma resposta automática como esta, podemos cair num grande problema, inclusive teológico. E é isso que uma fé irracional nos leva a fazer: coisas incoerentes. Então você me pergunta: então, Rodrigo, o que Deus é pra você? E eu te digo: Ele é tudo, e inclusive posso até falar cantando o hino que mencionei, mas explico: dentro do conjunto de coisas existentes e inexistentes, há o conjunto de coisas boas, e quando me refiro a Deus como sendo tudo para mim, O estou colocando neste conjunto. O que fiz agora, foi apenas mudar o paradigma. Eu saí do paradigma do Tudo/Tudo e entrei no paradigma do Coisas Boas/Tudo. Sem se pensar nisso, o meu conjunto do Tudo é tão vazio, que reduzo Deus a um tudo inexistente, porque muitas vezes quem usa esse termo fala isso somente porque Deus é tão inexistente ou irrelevante em sua vida que ela nem sabe definir o que Deus é para ela. Isto é o que desejo combater aqui. Quem diz que Deus é tudo sem pensar no que isso implica, pode estar colocando Deus em qualquer paradigma, seja ele bom ou mau. Pensar em que Tudo você quer colocar Deus, é fruto de uma grande reflexão, tanto que citei um paradigma no qual incluí Deus e posso colocá-lo em tantos outros bons paradigmas… Por isso, o hino 95 não apenas diz que Cristo é Tudo, mas a letra deixa claro em que paradigma o autor enxerga Deus. A pergunta agora é: em que paradigma você colocou Deus na sua vida? “Penso, logo existo” - Descartes.
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